A comunicação e a tecnologia diretamente aplicadas na realidade virtual do MOBA League of Legends:
Indubitavelmente, a comunicação
humana é um processo que envolve a troca constante de informações, utiliza os artefatos
e todos os seus desdobramentos como suporte para este fim. Isso logo de cara,
nos permite imaginar uma infinidade de maneiras de se comunicar, seja através de
gestos com as mãos, um bate papo informal face a face com outra pessoa, ou até
mesmo através de mensagens e sinais enviados utilizando a rede mundial de
computadores. O fato é que praticamente todos os recursos artificialmente produzidos
pelos seres humanos influenciam diretamente nesse processo, sejam eles
materiais ou simbólicos.
(Campeonato Mundial de LoL 2015)
Fonte : Riot Games
E atualmente no mundo dos e-Sports o
gênero predominante em todo o planeta são os MOBA’s, mas afinal o que são eles?
A sigla MOBA vem do inglês "Multiplayer Online Battle Arena" o que em
português significa "Arena de Batalha Online Para Vários Jogadores",
nas quais geralmente os jogadores se dividem em times e disputam partidas que
duram em média entre 30 minutos a 1 hora. É importante ressaltar que apesar de
possuir algumas semelhanças, o gênero MOBA não deve ser confundido com o MMO (Massive
Multiplayer Online), no qual milhares de jogadores interagem simultaneamente em
um mundo online aberto, controlando um único personagem no decorrer de uma longa
história com uma duração indeterminada, proposta pelos desenvolvedores desses
jogos.
Em pleno ano de 2019, já é um
consenso entre os “gamers” de todas as faixas etárias do mundo que o MOBA de
maior destaque em toda história da humanidade, o qual bateu todos os recordes
de vendas, doações, patrocinadores, transmissões até mesmo em grandes redes de
telecomunicações com uma audiência altíssima todos os sábados e domingos (como
o Sport TV, ESPN, YouTube, Twitch TV e a própria rede Globo e etc ) chegando
perto muitas vezes a audiência do futebol, sem falar na movimentação da
economia do mercado do gênero, em número de jogadores online e etc. é o League
of Legends da empresa Riot Games, esse jogo revolucionou de fato a indústria
dos jogos online, porque te permite jogar de maneira casual e divertida com
seus amigos do mundo todo duma maneira jamais vista antes, onde a cooperação e
o trabalho em equipe são fundamentais. Isso pode ser percebido a sátira feita
pelo canal Porta dos Fundos o qual é apreciado pelo mais diverso público em
todo Brasil :
O sucesso desse jogo segundo os seus próprios
desenvolvedores se deve ao fato do mesmo proporcionar a sua comunidade de jogadores,
uma interação fantástica e emocionante o qual os antigos jogos do gênero não
tinham a competência de realizar. Tudo isso ocorre associado a uma tecnologia de
redes incrível a qual envolve desde servidores de altíssima qualidade e
potência, a própria mecânica e dinâmica do jogo a qual requer uma comunicação
precisa e constante e sem esses dois fatores essenciais aqueles que se propõem
a jogar não conseguem vencer muito menos ir longe nesse jogo. O fator de
indução da comunicação e tecnologia neste MOBA é tão forte que existe até um
tribunal, isso mesmo, e não é exagero. Um tribunal oficial, dentro do jogo,
onde os jogadores denunciam jogadores racistas, homofóbicos, intolerantes, os
quais disseminam discurso de ódio ou se comportam de maneira inapropriada
durante as partidas com um intuito de estragar o jogo de quem encara esse
esporte com seriedade e tem um objetivo mais profissional, entre outras coisas que atrapalham a
jogabilidade... Após um certo número de denúncias recorrentes sobre um jogador,
através do registro de chat e da gravação da partida que é gerada
automaticamente, o “hater” já toma um lindo banimento, muitas vezes definitivo
do mundo do LoL (sigla pela qual o League of Legends é carinhosamente chamado
pela sua comunidade).
O que nos remete diretamente em um
primeiro momento, aos ensinamentos do bom e velho Michel Foucault no que diz
respeito ao que ele chama de “panóptico” na sua obra mundialmente consagrada,
Vigiar e Punir. O conceito do “panóptico” era literalmente duma penitenciária
perfeita, idealizada pelo filósofo e jurista inglês Jeremy Bentham em 1785.
Onde havia uma torre altíssima no meio da prisão, na qual um único vigilante
observava todos os prisioneiros, sem que estes possam saber se estão ou não
sendo observados. Desta forma, o medo e o receio de não saberem se estão a ser
observados os leva a adotar o comportamento desejado pelo vigilante. E essa
mesma política é claramente visível no cenário do jogo e em toda sua estrutura
a todo momento. Tanto com a existência de um sistema de gravação automática das
partidas na qual só empresa que administra o LoL tem acesso, sem falar no
sistema de registro automático do chat da partida e de todas as ações que
acontecem durante a realização da prática esportiva ou recreativa do jogo. Não
dá para o jogador saber se os outros players o denunciaram, se o próprio
sistema anti-cheat do jogo detectou o uso de programas ilegais, etc.
Ou seja, algumas pessoas jogam
profissionalmente e vivem desse jogo, outras pessoas jogam o LoL por diversão e
costuma ser mais divertido quando elas vencem as partidas, mas o sucesso no
League of Legends depende de muita coisa, é preciso mais que habilidade e bons
reflexos para se vencer, a sua capacidade de trabalhar em equipe tem um impacto
significativo no resultado final das partidas, e essa colaboração entre os
jogadores acontece a todo momento, seja através do sistema de emissão de áudio
do próprio jogo como também o da emissão de sinais e avisos, ou no próprio chat
de texto. Quando esses fatores entram em harmonia, segundo dados da Riot Games,
os jogadores vencem cerca de 1,7 milhões de partidas mais do que a média (isso
equivale a 35% a mais de vitórias). Informações tais as quais podem ser melhor
observadas num relatório de pesquisa em forma de vídeo que a empresa criou para
os jogadores terem uma noção do quando é delicada essa situação :
Mas será que essa comunicação de
fato ocorre de maneira efetiva? Ou ela é uma farsa? Uma ilusão? Mesmo com toda
essa indução tecnológica para que o processo de comunicação flua efetivamente
na grande maioria das partidas, infelizmente não é isso que ocorre. O jogo
possui uma das comunidades mais tóxicas do mundo na comunidade dos games, no
sentido dos jogadores não conseguirem se entender durante as partidas, não se
respeitarem, não conseguirem colaborar uns com os outros, problema tal que leva
a frustração do sonho de milhões de jovens adolescentes em todo o mundo os
quais infelizmente não conseguem subir de patente dentro do jogo, de jeito
nenhum e mesmo com anos de experiência no game continuam
nas piores colocações no cenário competitivo do jogo. O que nos leva a crer definitivamente
a importância, a seriedade e a profundidade das palavras ditas pelo célebre
Ciro Marcondes Filho, em muitos trechos da sua nova teoria da comunicação onde
ele afirma que apesar de toda tecnologia atual existente no planeta não
significa que estamos nos comunicando melhor e isso se reflete definitivamente na
vivencia diária na prática desse esporte ultramoderno chamado League of
Legends.
O grande filósofo Vilém Fusser, durante
seus 20 anos de atuação como professor de filosofia, jornalista, conferencista
e escritor, tenta explicar, de acordo com a sua concepção o quão artificial é o
nosso processo de comunicação e como tal ele requerer uma mediação tecnológica
sejam elas de objetos ou até mesmo de ações geradas por uns para outros, para
ele a comunicação é uma ação comum, ninguém se comunica sozinho, é um processo
de troca de consciências complexas e improváveis, as pessoas para se comunicar,
tem que entrar na mesma sintonia. E definitivamente o que diferencia das outras
espécies é a capacidade de produção e manipulação desses artefatos tecnológicos
ou não.
Tudo isso complementa perfeitamente
o trabalho do antropólogo, sociólogo e filósofo francês Bruno Latour, o qual
nos leva a crer em obras como “Jamais Fomos Modernos”, “Reagregando o Social” e
“Um coletivo de humanos e não humanos” que com os artefatos e sua influência
direta nas nossas relações sociais a comunicação efetiva de fato é extremamente
complexa e difícil, imagine sem eles. São a forma que desenvolvemos e
manipulamos essas tecnologias que nos diferem dos outros animais, como os
macacos, abelhas, formigas e etc. As quais infelizmente a cada dia que passa
são obrigadas a trabalharem juntas em equipe e estabelecerem uma comunicação
diária no intuito de sobreviverem mutuamente como uma comunidade. Esses animais
são obrigados a reinventar as suas estratégias comunicativas a cada dia, coisa
que não mais acontecem com os seres humanos devido as dobras no espaço tempo as
quais conseguimos explorar ao nosso bel prazer devido a esses artefatos
tecnológicos que nos auxiliam a todo momento em todas as atividades do nosso
cotidiano.
(Campeonato Mundial de LoL 2015)
Fonte : Riot Games
Conforme foi dito em toda a
publicação, o League of Legends teoricamente é um jogo simples, mesmo após anos
de evolução. Contudo, ao mesmo tempo, esse é um jogo bem técnico. Os comandos
básicos envolvem clicar na tela com o mouse para movimentar o protagonista e
acionar botões no teclado para lançar golpes, magias e as “ultimates”, como são
chamadas os ataques especiais e finais de cada personagem. A forma de jogar
também pode variar de acordo com o mapa. As partidas com ranqueadas de League of
Legends são a origem do verdadeiro espírito competitivo do jogo. Os usuários
jogam da mesma forma, em equipes, mas valendo um ranking que define o quanto
você é bom no game. Há seis níveis distintos: Bronze, Prata, Ouro, Platina,
Diamante e Desafiante. E os jogadores matam e morrem por essas patentes, quanto
mais vitórias, mais chance de subir para a próxima, quanto mais derrotas, mais
chance de ser rebaixado para um estágio inferior. Até mesmo a seleção de
personagens muda nessas partidas de LoL: deixa de ser livre, e é preciso
combinar com amigos de time sobre quem você deve escolher ou qual campeão deve
banir entre a escolha dos adversários. Portanto, fica evidente que no LoL para
que você e o seu time ganhe, definitivamente é preciso que o outro time perca.
E para isso é necessário um amplo e complexo processo comunicativo, associado a
toda uma tecnicidade que o jogo proporciona a todo momento. Por mais que haja
toda uma infraestrutura física e sistemática proporcionada pela rede criada
pela Riot Games, como dizia o Musso na sua obra “A Filosofia da Rede”, as
pessoas tem uma visão polissêmica da sua interação com essas redes de
comunicação e o problema é justamente a forma de comunicação que elas terão com
esses sistemas, pois isso de fato é o que vai proporcionar o bom funcionamento
dessas redes. Todas essas peculiaridades especiais de um MOBA se deve ao fato
de que queiramos ou não, vivemos numa sociedade da imaterialidade e da
velocidade aonde o reforço dos nossos laços da vida real são proporcionados por
essas redes e ainda de acordo com as palavras do estudioso Weissberg, toda essa
instantaneidade, reatividade, a temporalidade não só no LoL mas em nossas
vidas, está sob constante pressão. Por mais que haja sempre essa hipermediação
da recepção desses fluxos de dados pela internet.
Dar as orientações corretas e colaborar com os
seus companheiros é obrigatório para o sucesso nesse jogo. Tal reflexão nos faz
pensar nas palavras do nosso digníssimo professor doutor André Lemos o qual nos
diz em sua magnífica tese de doutorado justamente sobre essa questão da
tecnicidade em suas mais variadas formas para resolver os problemas horizontais
e verticais como maneiras de produzir uma narrativa, na maioria das vezes
satisfatória, para a hibridização do homem com as máquinas, objetos e etc. Essa
interoperabilidade contemporânea, presente no League of Legends e em
praticamente todas as áreas de nossas vidas existe para que tenhamos um domínio
maior da natureza e dessa radicalização da naturalização dos objetos técnicos,
produto da fusão dos mesmos com a ciência. Abaixo segue uma crítica singela,
resumida, porém bastante construtiva e pertinente feita por um jogador de LoL a
qual facilita ainda mais a nossa compreensão da problemática proveniente do
fenômeno contemporâneo das redes, discutida por nós nessa postagem :
Então caro leitor, nessa postagem fica evidente o quanto em cada partida de LoL na grande maioria das vezes, há uma pressão muito forte em cima dos jogadores e suas respectivas funções na partida, suporte (aquele que auxilia o time a continuar vivo com suas curas), tanker (aquele que vai na linha de frente das batalhas para suportar o dano adversário e proteger o seu time), damager (aquele responsável em causar muito dano e destruição ao adversário), jungler (aquele responsável em surpreender o adversário com investidas sorrateiras muitas vezes pelo flanco) e etc. Isso talvez seja mesmo um dos principais agravantes de mesmo com todo o aparato tecnológico que as redes disponibilizam, os jogadores ainda assim, não costumam se entender e preferem culpar uns aos outros pela incompetência do grupo em se comunicar de maneira singela e precisa.
BIBLIOGRAFIA UTILIZADA :
Marcondes Filho., C. Até que ponto de fato nos comunicamos?. SP, ed. Paulus, 2004.
Foucault, M. O panoptismo. In: Vigiar e Punir: nascimento da prisão. Petrópoles: Vozes, p. 186-214, 2009.
Latour, B. Reagregando o social: uma introdução à teoria do ator-rede. Salvador: Edufba, 2012. (Introdução)
Latour, B. Jamais Fomos Modernos., Editora 34, SP, 1994.
Lemos, A. A Comunicação das Coisas. Teoria Ator-Rede e Cibercultura. SP, Annablume, 2013.
Lemos, A., Cibercultura. Tecnologia e Vida Social na Cultura Contemporânea., Porto
Alegre., Sulina, 2002.
Musso, P. A Filosofia da Rede., in Parente, A., Tramas da Rede. Porto Alegre, Sulina, 2004.
Weissberg, J-L., Paradoxos da teleinformática., in Parente, A., Tramas da Rede. Porto Alegre, Sulina, 2004.
BIBLIOGRAFIA UTILIZADA :
Marcondes Filho., C. Até que ponto de fato nos comunicamos?. SP, ed. Paulus, 2004.
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Latour, B. Reagregando o social: uma introdução à teoria do ator-rede. Salvador: Edufba, 2012. (Introdução)
Latour, B. Jamais Fomos Modernos., Editora 34, SP, 1994.
Lemos, A. A Comunicação das Coisas. Teoria Ator-Rede e Cibercultura. SP, Annablume, 2013.
Lemos, A., Cibercultura. Tecnologia e Vida Social na Cultura Contemporânea., Porto
Alegre., Sulina, 2002.
Musso, P. A Filosofia da Rede., in Parente, A., Tramas da Rede. Porto Alegre, Sulina, 2004.
Weissberg, J-L., Paradoxos da teleinformática., in Parente, A., Tramas da Rede. Porto Alegre, Sulina, 2004.
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